Capa do livro. Imagem daqui. |
Arrisco-me a dizer que qualquer pessoa com uma educação elementar e alguma lógica de raciocínio consiga perceber quais as implicações de um sobrepovoamento: falta de alimentos, falta de água, falta de outros recursos (como a energia), falta de espaço.
Neste sentido, e continuando com esta lógica elementar e não-científica, apontam-se soluções igualmente lógicas: aumentar a produção de alimentos, tornar a água não-potável em água potável, aumentar a produção de energia, habitar espaços antes inabitáveis.
Pois bem, aquelas mesmas consequências do sobrepovoamento que um qualquer mortal pode enumerar são apenas o mínimo dos problemas que nos esperam se a população mundial atingir um número nunca antes visto e, pelas previsões científicas, catastrófico (2). Ademais, as suas respetivas soluções são irrealizáveis, uma vez que acarretam problemas maiores, pois todas as ações que o ser humano faz têm alguma implicação sobre o ecossistema.
Por exemplo, aumentar a produção de alimentos significa usar mais terra, o que destruiria habitats naturais, já para não falar do uso de pesticidas e fertilizantes que são poluentes; transformar a água não-potável em potável aumentaria a poluição, já que a construção dos sistemas de engenharia necessários é bastante poluente (o que, por sua vez, agravaria as alterações climáticas); aumentar a produção de energia, idem (3); habitar espaços antes inabitáveis significa não só a destruição de habitats naturais (mais uma vez), como também maior poluição, pois é necessário construir lares para os três mil milhões de pessoas que aí vêm.
Mas não haverá, realmente, soluções para os problemas do sobrepovoamento? Poderá haver, e essas soluções são de dois tipos: as soluções científicas e tecnológicas, e as soluções comportamentais, ou seja, mudar a nossa atitude face ao ambiente.
Uma das soluções científicas é a geoengenharia, que não é mais do que «a ideia de que podem ser necessárias aplicações de engenharia à escala planetária apenas para atenuar as piores consequências dos problemas que enfrentamos» (4). Porém, estas aplicações de engenharia não são viáveis, em primeiro lugar, porque não está comprovado cientificamente que resultem e quais os seus efeitos; em segundo lugar, porque implicam um grande investimento e, na verdade, nenhum governo investirá milhões numa solução que não está comprovada. Por outras palavras, a geoengenharia nunca será a solução.
No que toca à mudança das atitudes do ser humano, a esperança também não é muita, pois repare-se: a última coisa que o ser humano faz é mudar o seu comportamento/atitude, seja no que for. Com este problema específico, a mudança não seria, em teoria, mais simples: «consumir menos […] e conservar mais» (5). Mas, para essa mudança ocorrer, é necessário programas governamentais, ações e campanhas de conscientização, entre tantas outras coisas que acarretam investimentos que são considerados desnecessários pelos governos. Acontece que nós estamos completamente desinformados destes problemas, porque são poucas as pessoas que se prestam a informar-nos e, em consequência, nada fazemos.
Em suma, o que Stephen Emmott faz com este livro é serviço público, é informar a população leiga de ciência, de forma clara e elucidativa, os problemas que estão ali ao virar da esquina – para que qualquer leitor perceba o quanto estamos arruinados se medidas não forem tomadas.
Pode ser que o livro seja um exagero, pode ser que os problemas afinal tenham solução – mas será de bom senso acreditar e confiar na ciência, até porque as hipóteses de Emmott são bastante concludentes e ainda não foram refutadas. O que prova que, para além de muitos, inconscientes e desinformados, estamos perdidos.
Sobre o livro: Emmott, Stephen. Dez Mil Milhões – enfrentando o nosso futuro. Lisboa: Círculo de Leitores, 2013.
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1. Stephen Emmott, Dez Mil Milhões – enfrentando o nosso futuro (Lisboa: Círculo de Leitores, 2013), 183.
2. Um dos exemplos de Emmott foi o caso dos transportes: maior população significa mais transportes, o que aumenta a poluição – incluindo o próprio processo de fabricação, que implica, por sua vez, um grande consumo de água.3. Poder-se-ia considerar as energias renováveis, mas o investimento é grande e, segundo Emmott, seriam precisas várias décadas para as energias amigas do ambiente substituírem os combustíveis fósseis. Várias décadas significa que, se isso realmente acontecesse, seria tarde de mais. Neste sentido, o autor aponta como uma solução a energia nuclear, se bem que a curto-prazo.
4. Emmott, Dez Mil Milhões…, 160.
5. Emmott, Dez Mil Milhões…, 169.
NOTA: O texto foi escrito com as normas do novo Acordo Ortográfico.