Diz-se muito que se lê muito pouco. Não sei… Nunca me decidi a andar pelas ruas a perguntar às pessoas se lêem e, caso a resposta seja afirmativa, o quanto lêem – até porque é uma coisa que não me interessa: não quero perder o meu tempo a fazer perder o tempo a desconhecidos. E, convenhamos, enquanto eu iria fazer este inquérito por minha conta, tanto eu como os inquiridos poderíamos estar a ler.
Tentei observar os hábitos de leitura de conhecidos meus, mas… É, eu não conheço muita gente para ter dados suficientes para descobrir este mistério por mim mesma (bem-feito para mim, ninguém me mandou ser sociopata). Contudo, com as minhas capacidades de observação, e com algumas perguntas a pessoas competentes, cheguei à conclusão de que ninguém lê e ninguém é iluminado pela sabedoria que os livros transmitem (não podemos descartar a hipótese de eu apenas ter espiado pessoas que nem sequer sabem o que é um livro).
Quer se leia muito, pouco, muito pouco, ou mesmo nada (isto é grave…), é sempre de grande utilidade incentivar a leitura – sim, para que todos fiquemos iluminados ou ainda mais iluminados, dependendo do caso, com a sabedoria que os livros transmitem. Acredito imensamente que se todos lessem um livro por mês poderíamos não estar num mundo melhor, mas certamente que estaríamos mais inteligentes e contentes: inteligentes porque um livro ensina o que quer que seja e contentes porque poderíamos passar a viver na história desse livro e não na nossa vida miserável.
A questão, agora, muito pertinente, é a seguinte: como incentivar a leitura? Sim, como vamos fazer com que pessoas que só usam livros para porem debaixo do pé da mesa para que ela fique nivelada se transformem em pessoas solitárias cujos únicos amigos são os livros? (Reconheço que estes exemplos são uma completa hipérbole, mas deve haver alguém que se identifique com eles…). As minhas simples e muito humildes sugestões são estas:
1. Livros em jornais. Isto era uma coisa muito popular no século XIX e consiste em romances virem publicados por partes em periódicos (Dickens fazia isto, por exemplo). Como é que isto, exactamente, iria incentivar a leitura? Imensas pessoas lêem jornais, nem que seja nos cafés. Um título catita e uma história interessante chamam a atenção de alguém. Se a escrita for bonita e acessível a pessoa passa a gostar do conteúdo. Se o capítulo da história acabar a meio, a pessoa vai querer saber o que acontecerá a seguir, ou seja, vai ler o próximo capítulo.
As vantagens são claras: o escritor fica conhecido e ganha leitores, o jornal ganha leitores, o café ganha dinheiro (porque presumo que não haja alguém que tenha coragem suficiente para entrar num café e pôr-se a ler o jornal sem consumir nada) e se a história ganhar direito a um livro, esse livro está a meio caminho andado para o sucesso. Isto tudo, claro, numa perspectiva positiva e optimista das coisas. Vamos supor que ninguém lê jornais e que a história é hedionda. Nunca mais alguém quereria saber de literatura…
2. Mais Feiras do Livro. Não uma Feira do Livro por semana, mas duas ou três Feiras do Livro por ano sabiam bem para além de incentivar a leitura (ler aqui). E uma Feira do Livro ao ar livre, em tempo primaveril, em que qualquer comum mortal pode experimentar o prazer de folhear e ler um livro enquanto ouve os pássaros a cantar? Num espaço verde? Com alguém a tocar guitarra debaixo duma árvore? E outro alguém a recitar poemas? Era bom demais para ser verdade…
3. Máquina de livros. Esta foi inventada, segundo parece, por um brasileiro. Funciona como aquelas máquinas de vender doces, chocolates, bolachas, sandes e bebidas nas horas de maior aperto, só que em vez de mantimentos, tem-se livros. Porque não? Estamos num hospital à espera de sermos atendidos faz horas e esquecemo-nos do livro em casa (“oh, não tenho de tempo de ler no hospital”, pensamos nós; pensámos mal!). Compramos um nessas maquinetas e ficamos entretidos por mais algumas horas.
Como isto divulgaria a leitura? Não sei, mas quer-me parecer que haveria muitas pessoas a querer comprar livros nessas máquinas apenas por curiosidade. Poderiam muito bem ler e gostar do livro… Para mais, um local que se compre livros que não seja a livraria é um incentivo à leitura, pois há pessoas que cultivam um medo horroroso de livrarias.
4. Capas dos livros. Capas bem feitas e bonitas são meio caminho andado para conquistar um leitor. Isto é quase como as capas dos álbuns dos Iron Maiden que conquistam ouvintes. A nossa atenção centra-se na capa e ficamos com apetite em saber se o conteúdo do livro corresponde à capa. Seria útil, neste caso, não enganar as pessoas: não ponham boas capas em maus livros. Claro, isto tudo é uma questão de gosto. Afinal, o que é um bom livro e uma boa capa…?
5. Emprestar/dar/trocar livros. As iniciativas para estimular a leitura também têm de partir de nós próprios. Vamos fazer um favor às pessoas não iluminadas e emprestar ou oferecer livros. Se conhecemos a pessoa, conhecemos os gostos dela e sabemos do livro exacto que a vai conquistar para o fascinante mundo da imaginação alheia (sim, porque a imaginação que levou o escritor a escrever o livro não é propriamente nossa).
Porque não trocar livros? Se a Providência nos deu o agrado de sermos amigos de pessoas que também lêem e, melhor ainda, que partilham os mesmos gostos literários que os nossos, trocar livros a título definitivo ou temporário será uma boa ideia. Um livro que eu tenha, o meu amigo pode não ter e vice-versa. E se o nosso amigo tiver gostos por livros diferentes dos nossos, será uma oportunidade extraordinária de alargarmos os nossos horizontes e conhecimentos literários.
6. Sermos chatos como a ferrugem. A sério. Se falarmos bastante e com um tom entusiástico sobre um livro, talvez alguém se interesse por ele. Nem que seja só para que nos calemos com o livro… Podemos também saltitar ao mesmo tempo que gritamos e abanamos as mãos no ar, a outra pessoa ficaria a morrer de curiosidade sobre o livro. Temos sempre a hipótese de libertar o psicopata que há em nós e fazermos esta espécie de homenagem a um livro que consideramos péssimo – porém o objectivo aqui é incentivar a leitura e não afastar a pessoa dela.
7. Filmes bem feitos com mensagens subliminares. Por filmes bem feitos baseados em livros refiro-me a filmes que são, realmente, bem feitos, e não àqueles que omitem metade da história para acrescentar uma metade totalmente nova e nem àqueles que transformam as personagens magras em gordas, loiras em morenas, vilões em santos (e vice-versa). Com um bom filme sobre um bom livro pode fazer-se um bom leitor.
A mensagem subliminar é elementar. Consiste meramente em, de qualquer maneira, transmitir a seguinte mensagem às pessoas que estão no cinema: “Vai comprar o livro e lê-o. Depois compra outro. E mais outro. E continua a comprar. Mas não te endivides.”
8. Música. Não é para transformar os escritores em músicos nem pôr os músicos a escrever (qual seria o resultado disso?). É somente fazer músicas sobre livros. Um resumo cantado, digamos assim. Por exemplo, o primeiro contacto que eu tive com Admirável Mundo Novo não foi com o livro mas com a música e o álbum dos Iron Maiden. E não há mal nenhum nisso, eu era criança e muito nova para ler Aldous Huxley.
9. Clube de leitura. Pelo que vi na televisão (é que aqui não há disso…), é uma reunião de amigos onde se fala sobre livros e onde se comem petiscos. Claro que amigos que não sabem patavina sobre livros podem participar no clube, já que o objectivo é divulgar a leitura. E um clube de leitura escusa ser só entre amigos. Escolas, bibliotecas ou ainda livrarias podem perfeitamente ter um clube de leitura para o público em geral (não só para alunos, para leitores ou para clientes habituais). E um clube de leitura ao ar livre? Num espaço verde e com… não, não vou continuar com a mesma lengalenga…
10. Fazermos algo de útil com as redes sociais. A maior parte dos meros mortais tem um facebook. Porque não fazer com que as pessoas nossas amigas íntimas a nível virtual ganhem um gostinho especial pela leitura? Ilustrações de livros em vez de fotos nossas em momentos embaraçosos, excertos atraentes de livros em vez da descrição do nosso dia-a-dia enfadonho, ligações para sites com e-books e audiobooks. As possibilidades são infinitas.
11. Andarmos atrás das pessoas com um livro na mão. Para quê? Para lhes lermos o livro. Talvez resulte. Provavelmente levamos com o livro na cabeça, mas irá valer a pena se a pessoa se interessar por ele.
12. Ler à beira das pessoas com um sorriso de satisfação. Se o nosso sorriso for bonito, e se dermos a entender que estamos realmente a apreciar o livro, é muito óbvio que a pessoa quererá saber porque o livro nos apraz. E assim faz-se mais um leitor. Talvez resulte, talvez a pessoa não nos ligue nenhuma.
Ficaram aqui enumeradas uma dúzia de maneiras para incentivar, divulgar e estimular a leitura, muitas das quais estapafúrdias mas que talvez resultem. Só nos resta, agora, tentar. E se fizermos mais um leitor, mais um amante de literatura, saberemos que contribuímos para um mundo melhor – pelo menos mais inteligente.
*Imagens encontradas no google.