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Cartas a Um Jovem Poeta, de Rainer Maria Rilke

08/01/2011


Rainer Maria Rilke, nascido em 1875, foi um escritor alemão, considerado um dos maiores poetas do século XX. A sua obra é marcada por um forte pendor existencialista. Cartas a Um Jovem Poeta, como o nome indica, é um conjunto de cartas escritas pelo autor a um aspirante a poeta, Franz Xaver Kappus, que não sabia se deveria seguir uma carreira literária.

Neste conjunto de cartas podemos encontrar considerações de Rilke sobre a solidão, a escrita (poesia), a Natureza, Deus, o amor e a tristeza. Este livro torna-se fantástico pela profundeza dos temas abordados, mantendo, contudo, uma prosa simples e directa.

Em verdade, não há muito que dizer sobre o livro, pois é preciso lê-lo para o compreender. Apenas posso dizer que ler este livro é como se estivéssemos a ouvir conselhos dum sábio amigo, é como se fosse um consolo (como se as cartas de Rilke fossem escritas para nós). É, até, duma certa maneira impossível não nos identificarmos com alguns aspectos deste livro.

(…) Ninguém o pode aconselhar, ninguém o pode ajudar, ninguém. Há uma única via. Entre dentro de si. Investigue a razão que o leva a escrever, veja se ela lançou raízes no lugar mais recôndito do seu coração, pergunte se morreria caso fosse impedido de escrever. Acima de tudo, na hora mais silenciosa da noite, pergunte a si próprio: tenho de escrever? Escave dentro de si até encontrar uma resposta profunda. E se essa resposta for afirmativa, se puder enfrentar esta séria pergunta com um «tenho» simples e forte, então construa a sua vida de acordo com esta necessidade. (…) Evite por ora as formas mais comuns e correntes: são elas as mais difíceis, pois só uma grande força, já amadurecida, conseguirá criar uma coisa própria por entre a abundância de boas e por vezes brilhantes prestações. Evite por isso os motivos gerais e prefira aqueles que o seu quotidiano lhe oferece; descreva as suas tristezas e desejos, os pensamentos passageiros e a fé numa qualquer beleza. Se o seu dia-a-dia lhe parecer pobre, não o acuse de pobreza; acuse-se a si próprio, reconheça que não é ainda poeta o bastante para conseguir invocar as suas riquezas; pois para um criador não há pobreza e nenhum lugar é indiferente e pobre. (…) Queria apenas aconselhá-lo, por fim, a velar em silêncio e com seriedade pelo seu crescimento; não há perturbação mais violenta do que olhar para fora e esperar respostas exteriores a perguntas a que talvez só a sua sensibilidade mais íntima, nas horas de maior silêncio, poderá responder. (…)
Primeira carta

(…) Pois no fundo, e sobretudo mas coisas mais profundas e importantes, estamos indizivelmente sós, e para que um homem possa aconselhar ou sequer ajudar um outro, muitas coisas têm de acontecer e ser levadas a bom porto, uma constelação inteira terá de favorecer esta intenção.

[Sobre os livros]: Diante de si abrir-se-á um mundo, a felicidade, a riqueza, a incompreensível grandeza de um mundo. Viva dentro destes livros por algum tempo, aprenda com eles o que lhe parecer digno de ser aprendido, mas acima de tudo ame-os. Este amor será mil vezes retribuído e, o que quer que a vida lhe reserve, estou certo de que este amor fará parte do tecido do seu ser como um dos fios mais importantes por entre os muitos fios das suas experiências, desilusões e alegrias. (…)
Segunda carta

(…) Nenhuma experiência é demasiado insignificante, e mesmo o acontecimento mais miúdo cresce como um destino. (…)
[Sobre a crítica]: Confie sempre em si próprio e na sua sensibilidade; se estiver enganado, o crescimento natural da sua vida interior conduzi-lo-á lentamente e com o passar do tempo a novos conhecimentos. Deixe que os seus juízos sigam a sua própria evolução silenciosa e imperturbável que, como todos os progressos, obedece a uma profunda necessidade interior, não podendo ser imposta nem apressada. (…)
Terceira carta

(…) essas perguntas e emoções, que vivem uma vida própria na sua profundeza, não podem ser respondidas por ninguém; pois mesmo os melhores falham nas palavras quando querem designar o que é quase inaudível e quase indizível (…) Se procurar amparo na Natureza, tudo será para si mais fácil, mais coeso e de algum modo mais conciliador, talvez não no intelecto, que recua atónito, mas no mais íntimo da sua consciência, do seu conhecimento e atenção. (…) Não procure agora respostas que não lhe podem ser dadas porque ainda não as pode viver. E tudo tem de ser vivido. Viva agora as perguntas. Aos poucos, sem o notar, talvez dê por si um dia, num futuro distante, a viver dentro da resposta. (…)
Mas tudo o que um dia talvez venha a ser possível para muitos pode ser já preparado pelo solitário e construído com as suas próprias mãos, que erram menos. Por isso, caro Senhor, deverá amar a sua solidão e carregar o sofrimento que a acompanha com lamentos melodiosos. Pois aqueles que lhe são próximos estão distantes, como me diz, e isso mostra que a sua solidão começa a estender-se. E se o próximo parece distante é porque a sua solidão toca já nas estrelas e é desmedida. Alegre-se com o seu crescimento, que não poderá ser assistido por ninguém, e seja benevolente para com aqueles que ficam para trás, e mostre-se firme e tranquilo diante deles e não os atormente com as suas dúvidas e não os assuste com a sua esperança ou a sua alegria, que eles não podem compreender. (…)
Quarta carta

(…) Mas se notar que ela é grande, alegre-se, pois o que seria uma solidão (faça esta pergunta a si mesmo) sem grandeza? Há apenas uma solidão, que é grande e difícil de suportar, e quase todos conhecem a hora em que gostariam de a trocar por uma qualquer convivência, por mais vulgar e fácil, por uma aparência de harmonia mínima com o mais inferior, com o mais indigno… Mas é talvez nestas horas que a solidão cresce. Mas não se deixe perder. Só a solidão é necessária, uma grande solidão interior. Entrar dentro de si e não estar com ninguém horas a fio – tem de ser capaz disso. (…)
Sexta carta

(…) E não desespere da sua solidão por sentir em si um desejo de sair para fora dela. Precisamente esse desejo, se o usar com serenidade e distanciamento, como uma ferramenta, ajudará a estender a sua solidão sobre um território cada vez mais vasto. (…) É bom ser solitário, porque a solidão é difícil; que uma coisa seja difícil deverá ser mais uma razão para a fazer. (…)
Sétima carta

*Na imagem: o autor
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