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Os Meus Amores, de Trindade Coelho

08/05/2013

 Trindade Coelho. Imagem daqui.

Primeiro: devido a um erro de edição do livro que possuo e, ainda mais, da minha ignorância, só com longas e intermináveis pesquisas é que consegui saber o nome do autor – como qualquer mortal, apenas o conhecia por Trindade Coelho. Espanto meu quando soube que Trindade Coelho, escritor, teve um filho Trindade Coelho, também ele escritor. O critério para saber quem escreveu o quê: para além das datas de nascimento e de publicação de livros, o facto de que Trindade Coelho, o filho, desprezava as suas raízes campónias, nunca podendo, assim, escrever um livro de contos rústicos.

Segundo: envergonho-me da minha ignorância literária, pelo descrito acima. Essa ignorância é ainda maior se atendermos ao facto de que nada sei sobre o conto rústico (isto é, nunca li, de maneira séria, nada desse tipo literário). Portanto, o pouco que posso afirmar reside no senso comum: é um género de temática rural. Tudo isto para dizer que Os Meus Amores é um conjunto de contos rústicos que exalam valores tradicionais (amor, amizade, união, justiça, saudade…), costumes populares (como festas) e simplicidade.

Terceiro: o livro está dividido em três amores – Amores Velhos, Amores Novos, Amorinhos. O livro, precisamente, fala de amor: amor quase esquecido, amor inocente, amor de um pai que não quer ver o seu filho mudar de país, amor de uma mãe que vê o seu filho morrer, amor proibido, amor por um animal de estimação, amor fraternal entre amigos, amor pela natureza, amor pela terra de origem.

Quarto: o livro toca o sentimental, algumas partes conseguem a comover (por exemplo, o viúvo a deambular de madrugada pelo seu jardim a recordar a sua mulher e a sua filha). Está escrito, precisamente, de uma maneira doce, sensível, bonita. De destacar as impressionantes descrições que o autor faz da natureza ou mesmo dos sentimentos.

(…) Poucas flores: uma coisa que todos notavam com estranheza. Mas desde que lhe morrera a mulher mais a filha, o José Cosme deixara-se de as cultivas, e nos canteiros assim devolutos tinha semeado repolhos, que por sinal vinham enfezados. Só teve o cuidado de não deixar morrer os goivos. Uma vez por ano, em fins de Maio, colhia-os todos de uma vez, e ia levá-los em braçado à sepultura das suas defuntas.

Exactamente nessa tarde, tinha ele ido ao cemitério fazer a fúnebre visita. Quando se recolheu já era noite. Mal acabou de cear, levantou-se bruscamente da mesa e foi-se para o horto, com uma grande vontade de chorar. Estava nas suas horas tristes, nessas horas em que as energias todas da sua alma e até as do seu corpo vergavam sob o flagelo de uma dor violenta, exacerbada agora pela saudade dos que lhe tinham morrido… E para maior desgraça, fugira-lhe o bem das lágrimas. De modo que, sem esse lenitivo, aquelas medonhas tempestades custavam o dobro a suportar.

Abstracto, numa espécie de entorpecimento idiota, percorria sem descanso todas as ruas do horto, cabisbaixo, acabrunhado, autómato. (…)

Última Dádiva

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